A Ball Corporation, que fabrica latas de alumínio, inaugurou no dia 20 de outubro as obras do seu laboratório de economia circular em Fernando de Noronha (FE).
O projeto, chamado #Vadelata pelo Planeta, deve ficar pronto entre abril e maio de 2022 e será base para o início do processo de reciclagem das latinhas e local para demonstração de novas tecnologias que diminuam o uso de combustíveis fósseis, além de ter ações educativas focadas em meio ambiente para moradores e turistas.
Não há lixão ou aterro sanitário no arquipélago, e todo o lixo produzido passa por uma usina de reciclagem. Lá é feita a triagem dos materiais, que então são transportados de barco para Recife.
Com o laboratório, a Ball passará a ser responsável pela coleta, compactação e transporte das latas de alumínio, que serão encaminhadas para uma das fábricas da empresa em Pernambuco e depois para a Novelis, fornecedora da companhia e patrocinadora do projeto. A empresa faz a reciclagem do material, convertendo-o em novas bobinas de alumínio.
Segundo a Abralatas (Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alumínio), o Brasil reciclou em 2020 97,4% das suas latinhas. Isso correspondeu a quase 31 bilhões de unidades.
A expectativa é que o laboratório viabilize a reciclagem de 50 toneladas de alumínio no primeiro ano. Segundo a Ball, haverá um aplicativo para que os moradores e empresários agendem a coleta das latas. A empresa vai espalhar pontos de entrega voluntária pelo território, e carros elétricos serão usados no transporte do material.
Como explica Estevão Braga, diretor de sustentabilidade da Ball para a América do Sul, uma planta geradora de energia solar será instalada no terreno do laboratório, em parceria com a Neoenergia, antiga Celpe (Companhia Energética de Pernambuco), para fornecer eletricidade aos veículos.
Guilherme Rocha, administrador de Fernando de Noronha, afirma que a ação vai reduzir em 20% a 30% o gasto público do arquipélago com a gestão de resíduos, já que o alumínio tem essa participação no total de lixo gerado no local.
“Casamos ideias importantes: [a questão] ambiental, o trabalho da reciclagem, de dar novas oportunidades de geração de renda e desenvolvimento social, e também desonerar os cofres públicos”, diz.
Há alguns anos, o território tenta se tornar mais sustentável. Desde 2019 está proibida a entrada e comercialização de plásticos de uso único, e só são permitidas garrafas com volume acima de 500 ml.
Também existem outras parcerias com empresas para reduzir o impacto ambiental, como uma máquina doada pela cervejaria Heineken. O equipamento faz a trituração de garrafas de vidro, convertendo-as em um pó usado na construção civil no arquipélago. Há também uma parceria com a Renault para a entrada de carros elétricos.
Fernando de Noronha também foi escolhido para receber o laboratório por atrair milhares de turistas ao ano, e, entre eles, muitas celebridades.
“Temos que escolher um local de alta visibilidade, onde passam formadores de opinião, para que a gente consiga mostrar, não só pelo case da lata de alumínio, mas através de outras tecnologias, o que chamamos de desenvolvimento sustentável”, diz Braga.
Segundo ele, a ideia é educar turistas e moradores, para que eles optem pelas embalagens de alumínio.
A Ball não divulgou quanto vai investir no projeto. A AMA,segmento de água da AMBEV, , e a Minalba também são patrocinadoras do laboratório. As duas marcas lançaram recentemente água mineral em latas de 330 ml.
“Em vez de consumir água em garrafa pet, que a cada duas unidades, no Brasil, uma é reciclada em outras coisas, como camisetas, e depois vai para o lixo, por que não usar uma embalagem que não vai gerar resíduo?”, questiona Braga. “Queremos mostrar para as pessoas que elas podem continuar consumindo a mesma bebida, que podem viver com o mesmo nível de conforto, mas gerando um impacto menor”, completa.
Além da água, o setor tem lançado outras bebidas envasadas no material, como vinho, gim e café. “Ainda não conhecemos uma bebida que você não possa colocar em lata”, diz Fauze Villatoro, vice-presidente comercial da Ball para a América do Sul.
A Ball também pesquisa uma forma de vender latas que possam ser fechadas, para permitir o consumo parcelado do produto. Segundo o executivo, uma embalagem do tipo está passando por testes em Denver, nos Estados Unidos, e pode chegar ao mercado nacional até o final de 2022.
O desafio, segundo Villatoro, é encontrar uma forma de fechar as latas que não demandem o uso de plástico nem de borracha, o que atrapalha a reciclagem.
O executivo afirma que há resistência em adotar a lata de alumínio para substituir as garrafas pet, porque o custo do plástico chega a ser de três a cinco vezes menor por unidade, mas que as empresas e consumidores estão percebendo o peso do benefício ambiental nessa conta, como foi o caso da água em lata feita por Ambev e Minalba.
“A partir do momento em que entendem que isso é um valor para o consumidor e para a imagem institucional, fica mais fácil”, afirma o executivo.
Tipos diferentes de usos também facilitam a inserção da lata. “Não vale colocar água em lata em mercado de bairro, porque não vai vender, mas [funciona] em restaurante, para consumo no local”, diz Villatoro.
Três quartos de todo o alumínio consumido pela empresa, que foi responsável por 47% das latas produzidas no país no ano passado, é fruto de reciclagem. Segundo Braga, a meta é aumentar essa participação para 85% até 2030.
Além de evitar o descarte das latas no meio ambiente, Braga ressalta que a reciclagem gera renda para 800 mil catadores no país. O processo de reconversão do alumínio das latas em novas bobinas, usadas na fabricação de novos recipientes, também consome apenas 5% da energia utilizada na fabricação do material virgem.
Usar mais alumínio reciclado ajuda ainda a companhia a depender menos das fontes extratoras de bauxita, minério que é matéria-prima do alumínio, e a se proteger das oscilações do preço do material.
Em setembro, uma tentativa de golpe militar em Guiné, país extrator de bauxita, além da preocupação com a produção chinesa do material, levou o alumínio a apresentar seu maior preço desde 2008, a US$ 3.000 (cerca de R$ 17 mil) a tonelada.
Desde o início da pandemia, o preço do material também flutuou por causa da dificuldade para conseguir contêineres e pela elevação do custo do frete, diz Villatoro.
“Quanto mais o alumínio virar alumínio, diminuirá nosso custo e dependência dos centros extrativistas”
Fonte: Folha
Autora: Ana Luiza Tieghi