Quando Cris Dios recebeu o convite para representar o Brasil na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2022 (COP 27), que acontece em novembro no Egito, sua primeira reação foi de surpresa. Apesar de estar à frente do grupo familiar de beleza Laces and Hair, fundado em 1987 em São Paulo, a empreendedora nunca pensou que as práticas de sustentabilidade que adota nos salões e nos cosméticos poderiam levá-la a participar de uma conferência internacional sobre o clima.
“No Laces praticamos sustentabilidade há 35 anos, mesmo que na época não houvesse esse rótulo ainda. Nem nos nossos melhores sonhos imaginamos que um dia poderíamos representar o Brasil, é uma grande honra”, diz em entrevista.
O convite, que chegou em novembro do ano passado, é para que Cris e a equipe do Laces apresentem, em dois painéis de 15 minutos, as medidas sustentáveis que adotam no grupo, desde a reutilização da água dos lavatórios até a compensação das emissões de carbono. “A gente faz sustentabilidade na prática justamente por acreditar que isso pode deixar um legado para as pessoas e um retorno para o planeta. Poder compartilhar nossas experiências com outras empresas no Egito, que é o berço da civilização e das histórias de beleza, para mim é um grande presente”, diz Cris.
A participação na COP 27 é uma consagração do trabalho que a empresária vem fazendo nas últimas décadas. O grupo, que nasceu nos anos 1980 a partir de um salão de beleza criado por sua mãe, Mercedes Dios, hoje conta com oito salões (cinco em São Paulo, dois no Rio de Janeiro e um em Belo Horizonte), o e-commerce de produtos naturais Slow Beauty, uma fábrica de cosméticos orgânicos que produz três linhas de produtos próprios e a consultoria Carbon Limited, especializada na compensação voluntária de carbono.
A sustentabilidade e a preocupação em usar produtos naturais não poluentes estiveram presentes desde o primeiro salão do Laces. Parte disso se deve à herança que o pai de Mercedes, João Manuel Dios, deixou para a filha. Espanhol, ele imigrou para o Brasil na década de 1920 e trouxe com ele dezenas de fórmulas naturais para cuidar de problemas no cabelo e nas barbas. No bairro paulistano do Brooklin, o barbeiro era referência no tratamento de doenças do couro cabeludo, coceira e falhas de cabelo utilizando infusões de ervas. “Minha mãe cresceu vendo ele cuidar das pessoas e quis seguir o mesmo caminho”, diz Cris. “Quando começamos, em 1987, a base dos cosméticos veio das fórmulas do meu avô.”
Mas, para ela, seguir os passos da mãe e do avô não foi um caminho óbvio. Apesar de ajudar no salão desde adolescente, a empreendedora estudou arquitetura durante dois anos até perceber que era apaixonada mesmo por cabelo. Ao voltar para a empresa da família, ela teve a missão de aprimorar as fórmulas dos produtos usados no salão. “No começo, nossos produtos duravam um mês e precisavam ficar guardados na geladeira. A gente tinha nosso próprio jeito de fazer, as ervas primeiro viravam infusões e depois shampoos, mas não conseguiríamos ganhar escala dessa forma, a indústria não queria fabricar”, conta. O jeito que ela encontrou para dialogar com os fabricantes foi estudar cosmetologia. “Meu foco era desenvolver produtos que não agredissem nem o ser humano, nem o meio ambiente. De que adianta um shampoo com maior período de conservação, mas mais poluente?”, diz Cris.
Aliando o conhecimento familiar com o que aprendeu na indústria farmacêutica, Cris levou o Laces para um novo patamar. Já consagrada na capital paulista, a empresa buscou a partir de 2011 uma gestão mais profissional para expandir os salões e os produtos naturais nacionalmente. Com isso, Itamar Cechetto, esposo de Cris, assumiu a presidência do negócio, enquanto ela hoje comanda as áreas de desenvolvimento de produto e de pessoas. “Adoro estar todo dia no salão, em contato com os clientes e com os funcionários. Aqui, todos que entram precisam passar por um treinamento para aprender sobre os produtos e sobre nossas práticas sustentáveis”, conta a empreendedora.
No salão, por exemplo, os profissionais de beleza são ensinados a utilizar uma ferramenta própria para fazer luzes e reflexos nos cabelos, já que desde 2006 a empresa não utiliza mais papel alumínio nesses procedimentos — no total, mais de 11 toneladas do material já foram economizadas. Na frente de produto, além de utilizar plástico biodegradável para as embalagens, Cris se preocupa em criar fórmulas não poluentes. No Brasil, o Laces foi um dos primeiros salões a desenvolver colorações para cabelo utilizando somente plantas.
Por Carolina Ingizza, da revista Marie Claire